Foram registradas 235 candidaturas para o Senado Federal nas eleições deste ano em todos os estados e no Distrito Federal, segundo estatísticas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Três desses registros são de candidaturas coletivas, que prometem praticar o chamado “mandato coletivo”, com decisões compartilhadas por um grupo.
Esse tipo de candidatura propõe a tomada de decisão coletiva em relação aos posicionamentos nas votações e demais atos legislativos do mandato conquistado. Embora sem amparo legal, o conceito já está em prática em algumas assembleias legislativas e em câmaras municipais.
Atualmente, não existem “candidaturas coletivas” na legislação eleitoral, muito menos “mandatos coletivos” previstos na Constituição. Entretanto, uma resolução do TSE admite a possibilidade de uma candidatura ser divulgada como iniciativa de um grupo ou coletivo, que podem ser compostos por qualquer número de participantes.
Segundo a resolução do TSE, essas candidaturas podem ser promovidas coletivamente, mas o registro permanece de caráter individual, ou seja, apenas uma pessoa do grupo é o candidato oficialmente registrado e é essa pessoa que será empossada em caso de vitória nas urnas. O nome do candidato oficial pode aparecer na urna eletrônica com o nome do coletivo ou grupo ao lado. E é só a foto do candidato oficial que aparece na urna na hora da votação.
Candidatos ao Senado
No Distrito Federal o tribunal eleitoral registrou a candidatura para o Senado de Pedro Ivo Mandato Coletivo (Rede). No estado de São Paulo o TSE registrou a candidatura Mancha Coletivo Socialista (PSTU). Já no estado de Espírito Santo foi registrada a candidatura Gilberto Campos Coletiva (PSol) para o Senado.
Na avaliação de Ana Luiza Backes, consultora legislativa da Câmara dos Deputados, o exercício coletivo pode dar mais transparência ao mandato. Ela é autora de um estudo sobre o tema, recentemente publicado na revista Agenda Brasileira nº 5.
— Candidaturas coletivas ao Senado são uma bela novidade, não tenho conhecimento que tenha havido nas eleições anteriores. O cargo de senador tem certas características que talvez até facilitem o exercício coletivo do mandato — o senador é eleito com dois suplentes. Desta forma, são possíveis acordos entre o titular e os substitutos para partilhar o exercício do cargo. Observe-se que acordos deste tipo já são uma prática comum, como muitas vezes é noticiado — disse a consultora legislativa.
Assim diz a Resolução 23.609 do TSE, de 2019: “No caso de candidaturas promovidas coletivamente, a candidata ou o candidato poderá, na composição de seu nome para a urna, apor ao nome pelo qual se identifica individualmente a designação do grupo ou coletivo social que apoia sua candidatura, respeitado o limite máximo de caracteres”.
Em seguida, no entanto, a resolução proíbe “o registro de nome de urna contendo apenas a designação do respectivo grupo ou coletivo social”.
Essas duas disposições foram criadas em 2021, por meio de outra resolução (Resolução 23.675), que alterou a norma de 2019. É uma mudança imposta pela dinâmica social, como avalia o consultor legislativo da Câmara dos Deputados Roberto Carlos Pontes.
— A lei formal não traz nada de disciplina a respeito disso. Essa foi uma uma construção que partiu da própria sociedade, esse tipo de organização. O TSE, por meio de suas resoluções, até avançou um pouquinho. Porque esse é um fenômeno que se adiantou em relação à lei. É provável que o Congresso discipline isso mais adiante — disse o consultor.
Desse modo, embora as candidaturas coletivas não existam na forma de lei, elas podem ser promovidas coletivamente e anunciadas ao eleitorado. Para todos os efeitos legais, entretanto, só a pessoa que toma posse no cargo é considerada parlamentar de pleno direito.
Propostas
Tramitam no Congresso uma proposta de emenda à Constituição (PEC), um projeto de lei complementar (PLP) e projetos de lei ordinária (PL) que buscam regulamentar candidaturas coletivas ou mandatos coletivos.
A PEC 379/2017, da deputada federal Renata Abreu (Podemos-SP), acrescenta dispositivo ao art. 14 da Constituição determinando que os mandatos, no âmbito do Poder Legislativo (vereadores, deputados e senadores), “poderão ser individuais ou coletivos, na forma da lei”, ou seja, cria a possibilidade mas deixa a regulamentação para lei futura.
“O mandato coletivo revela-se uma alternativa para reforçar a participação popular e expandir o conceito de representação política”, afirma a autora da PEC.
O PLP 112/2021, da deputada Soraya Santos (PL-RJ), ficou conhecido como Novo Código Eleitoral. Essa proposta foi aprovada pela Câmara dos Deputados em setembro de 2021, lembra o consultor Roberto Pontes, e depende agora de decisão dos senadores.
O texto aprovado pelos deputados promove ampla reformulação na legislação eleitoral e autoriza a prática de candidaturas coletivas para os cargos de eleições proporcionais: deputados federais, estaduais, distritais e vereadores. O partido terá que regulamentar essa candidatura em seu estatuto ou por resolução do diretório nacional, mas a candidatura coletiva será representada formalmente por apenas uma pessoa.
O PL 4.475/2020, do deputado João Daniel (PT-SE), foca em regras para registro das candidaturas coletivas. O projeto altera a Lei Geral das Eleições (Lei 9.504, de 1997) para estabelecer que o nome do candidato poderá ser acompanhado pelo nome do coletivo ou grupo que o apoia. O projeto proíbe que o nome na urna eletrônica seja apenas o do grupo ou coletivo social.
Na visão do autor, “a organização coletiva de campanhas eleitorais representa um anseio legítimo de promoção da renovação política por meio de um modelo de campanha participativa, compartilhada e menos personalista”.
Outros três projetos que tratam do tema foram apensados ao PL 4.475/2020, entre eles o PL 1.593/2021, do deputado Paulo Teixeira (PT-SP), que também busca regulamentar as candidaturas coletivas. Já o PL 4.724/2020 e o PL 1.422/2021 vão além e propõem a regulamentação do exercício de um mandato coletivo.
O PL 4.724/2020, do deputado André Figueiredo (PDT-CE), dispõe sobre o “exercício coletivo” de mandatos legislativos federais, estaduais, distritais e municipais.
O projeto cria a figura do coparlamentar: “cidadão participante de um mandato coletivo cuja posição deve ser consultada para a definição da decisão do parlamentar, no exercício das suas atribuições legislativas”. Mesmo assim, o mandato pertencerá ao candidato eleito, não ao grupo. Também determina que o mandato terá um estatuto com acordo formal delimitando “os elementos fundamentais do vínculo contratual entre o parlamentar e os coparlamentares”.
“Nesse novo modelo de mandato, duas ou mais pessoas se unem em torno de um nome para tentar uma vaga eletiva no Legislativo e passam a compartilhar o mandato depois de eleitos. Isso significa que o mandato não é de um, mas de todos que contribuíram para a eleição. Toda e qualquer decisão será tomada pelo grupo, como as votações dos projetos e as ações em Plenário. Assim, todos os posicionamentos do político são resultantes dos diálogos e das interações com o grupo”, afirma André Figueiredo.
Já o PL 1.422/2021, do deputado Bacelar (Podemos-BA), cria o Coletivo Parlamentar, grupo que será composto por um membro-representante (que será o parlamentar eleito) mais dois membros-participantes, que também terão direito a algumas prerrogativas, como imunidade parlamentar e participação nas decisões do mandato coletivo.
“As vantagens do mandato coletivo são muitas, podendo ser citadas a menor dispersão de votos alinhados com pautas semelhantes, o aumento da representatividade dos grupos e a ampliação da capacidade de unir esforços para a organização de campanhas eleitorais”, argumenta o autor.
Mandatos coletivos
Atualmente, já existem mandatos coletivos em assembleias legislativas e câmaras de vereadores em praticamente todos os estados, veja alguns exemplos em atividade:
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A Câmara Municipal de São Luís (MA) tem como titular de uma das cadeiras o Coletivo Nós (PT), com seis “co-vereadores”.
Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)